O Concurso

28/05/2014 12:41
 
Perto do seu escritório havia uma biblioteca, e ela faria um concurso de poesia falada a Mário de Andrade. Junto com a secretária, que sempre estava escrevendo uma novela, mais a estagiária, inscreveu-se no concurso. A sua poesia era a menor, a mais curtinha, a mais...
 
   Esse poema havia nascido em uma época que teve a idéia de um filho, apenas uma idéia, mas como doeu! Tinha vindo da Argentina para passar o natal e viver aqui, após inúmeros problemas. Ela estava grávida.
 
    Uma manhã, ela partiu para a Bolívia. A partir daí começou a juntar dinheiro para passar um tempo, quiçá viver em La Paz, quando, em fevereiro, o telefone toca. Era ela. Havia abortado o projeto de felicidade de ambos.
 
     Durante o período em que se preparava para ir, e em que vivia nesta expectativa, escreveu aquele poema, que naquela noite iria recitar.
 
    O mesmo estava escrito e emoldurado na parede do escritório, pois, além da idéia que havia tido, no passado, sua expressão escrita, naquela pequenina ode, havia se transformado em lema para ele.
 
     Houve eliminatória, e o único poema a ir para a final dos três, foi o seu.
 
   No dia da final, convidou pai, mãe, sobrinho e afilhado, afinal era uma oportunidade e ocasião única de se assistir, as finais de um concurso de poesia falada.
 
 Quando escrevera aquelas linhas, escrevera muito mais para si do que para quem viria; ele se havia posto no papel de pai e filho, ao mesmo tempo. Era uma pequena autobiografia, um instantâneo seu daquele momento.
 
    Foram-se apresentando, um por um nas declamações. As poesias eram complexas, compridas, e o público mostrava sinal de cansaço pelo evento.
 
   Quando ele foi chamado, subiu, olhou para os espectadores e recitou:
 
              “Tudo o que meu filho me pedir, eu lhe darei,
 
               Mas, se um dia me pedir uma estrela,
 
                Eu saberei compreender,
 
                Eu sempre quis ter uma estrela”....”
 
   A platéia, num misto de atônita e maravilhada, veio abaixo. Depois de agradecer, ao sair, vieram lhe dizer que, independentemente do resultado da premiação, o seu havia sido o melhor, o que mais havia comovido. Ele, ao recitar seu poema para o público, falou para aquele que viria, e que talvez nunca venha.
 
   Como podia se esperar, o júri acabou escolhendo outro poema, mais representativo, que falava de Modernismo, da semana de arte de vinte e dois, de Mário...
 
  Mas ele levou para casa o agradável gosto da ovação a suas idéias, seus sentimentos... Isto nenhum prêmio tira!
 
 

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Escritor Tito Laraya

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